quarta-feira, 31 de março de 2010

Vizinha nova

Chegou uma vizinha nova,
que é o assunto nas calçadas.

Essa não vai ser como a Zezé,
que fez jogo duro quando mudou.

Até o Osvaldo confessar
que comia a neguinha
nos fundos da mercearia,
ninguém tinha muita esperança.

Mas a Zezé, durona,
só queria dar pra ele.

Acabou indo embora
quando o Osvaldo enjoou dela.

Com essa nova,
vai ser diferente!

Ela é até melhor que a Zezé...
Uma boa bunda e uns bons dentes.

Sérgio Medeiros

quarta-feira, 24 de março de 2010

Na vila dos homens

Morei, há alguns anos,
na vila dos homens,
e não gostei de ficar lá.

Agora, que quero voltar,
talvez não haja lugar.

Disseram-me que à noite,
e às vezes no chá da tarde,
posso ir visitá-los.

Então calço sapatos novos,
visto as suas roupas
e danço as suas danças.

Depois, devo me retirar.
Na vila dos homens,
nem sempre há lugar
para um estranho ficar.

Sérgio Medeiros

quarta-feira, 17 de março de 2010

Pequena explicação sobre escrever

Uma vez estava conversando com a minha amiga Natalia e ela me perguntou como comecei a escrever poesia. Respondi que quando ficava entediado tinha vontade de escrever. Ela então me disse:

- Se sentia vontade de escrever, então é porque você já era um escritor, eu nunca teria feito isso.

Fiquei um tempo pensando no que ela me disse, pois antes achava que todos sentissem essa vontade de rabiscar algo.

Pouco depois, ao ver um homem morrer na rua, senti esse desejo novamente.


O homem que andava pela rua

Quando o homem
que andava pela rua
caiu e morreu,
não lhe dei a mão.

Não o abracei,
não rezei por ele,
nem tentei, inultilmente, ajudá-lo.

Quando o homem
caiu e morreu,
passei apressado ao seu lado
e numa pequena banca
comprei um lápis.

Com o lápis,
escrevi este poema.

Um poema
que não fala de heróis,
de poetas audazes,
ou de nobres ideais.

Mas lembra o meu companheiro,
desconhecido,
que caminhava pela rua
e está morto no chão.

Sérgio Medeiros

quarta-feira, 10 de março de 2010

Poema do não saber

Não sei se bebo,
se te escrevo,
ou leio um livro
e me adormeço.

Não sei se logo
a chuva cai,
ou se essa nuvem
só se distrai.

Não sei se volto
durante o inverno,
ou se outro tempo
é o tempo certo.

Não sei se pinto
o seu nariz,
ou se cubro teus lábios
com as cores do meu giz.

Sérgio Medeiros

quarta-feira, 3 de março de 2010

Nesses dias de abril

Nesses dias
de abril
em que faz frio
e os homens
guardam-se em casa,
é difícil
arrumar abrigo.

É difícil
arrumar amigo,
mulher
e qualquer pessoa
pra se distrair.

Nesses dias
de abril
em que os homens
guardam-se em casa,
é difícil não ler livros
e não fazer versos.

Nesses dias,
de abril,
é difícil não beber,
não sentir a cabeça explodir
e não acordar desanimado.

Nesses dias
de abril,
anda difícil viver.

Sérgio Medeiros