terça-feira, 21 de outubro de 2014

Quase tudo

Fiz um poema
que fala
de quase tudo.

Fala de flores
e da angústia
de quase viver.

Fala com tanto carinho
das putas que quero comer.

Fala de uns olhos
que ninguém mais tem.

Fala de umas coisas
que talvez eu
devesse guardar num baú.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Dez caramelos

Dez caramelos não são
divisíveis por três.

Cabia ao irmão
que fizesse a partilha
ganhar um caramelo a mais.

Havia uma pequena briga
pra ver quem dividiria
os caramelos.

Quando fiz uns oito anos
minhas irmãs deixaram
eu fazer a divisão.

Era meu aniversário
e eu me dei
seis caramelos.

Houve protestos,
mas não uma nova partilha.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Mil flores

Até quando contar
as pessoas queridas
que morreram?

Talvez seja melhor
deixar os números
descansarem.

Nem tudo nasceu
pra se contar.

Também não se escolhem
os dias para chorar,
apenas as flores
onde repousar.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Gol

Umas coisas ficam
na memória da gente.

O arranhão
do cachorro Bilu.

O armário caindo
em cima de mim.

O gol da vitória
no jogo da escola.

Quem lembra?

O goleiro
defendeu uma cabeçada,
chutaram o rebote no zagueiro
e a bola sobrou pra mim.

Não tinha levado o tênis
e me emprestaram
um par de meias pra jogar.

Foi um chute cruzado,
o gol da vitória.

Quem lembra?

Umas coisas ficam.

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Revolução

As botas dos soldados caminham
pela Avenida Treze de Maio,
antiga Quinze de Fevereiro.

Os chefes dos soldados,
por alguma razão,
não gostavam do velho nome.

Em treze de maio,
essas botas marcharam
pela primeira vez sobre fevereiro.

Com isso decretaram
o fim do tempo antigo.

São botas que parecem
controlar o tempo,
mas não seus passos.